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Uma reflexão sobre John Deacon


Depois de na semana passada nos ter vindo falar de Under Pressure, hoje o nosso colaborador John Aguiar segue a linha do baixo e traz-nos uma reflexão sobre John Deacon... Hoje, mudo novamente “o bico ao prego” do que vinha falando nas últimas semanas. Em vez de ir ao baú das histórias da mitologia da banda, prefiro fazer uma breve reflexão sobre aquele que é, provavelmente, o meu elemento favorito dos Queen, John Deacon.

Todos nós, fãs de Queen, temos um lugar especial para Freddie Mercury. Por todas razões, Mercury será sempre o nosso “líder espiritual” e isso nunca será contestado. Todavia, não sou daqueles para quem os Queen são Freddie + três. Aliás, fã que se preze nunca pode pensar assim. E o meu elemento favorito é, por várias razões, John Deacon. Não irei fazer uma resenha da história do baixista. Para isso, basta ir à Wikipedia (como se isso fosse necessário para nós, fãs). Prefiro antes escrever sobre o que representa Deacon no grande quadro que são os Queen, do antes e o agora.

John Deacon tinha só 20 anos quando ingressou nos Queen, foi o último a chegar a uma banda que estava formada sim, mas que procurava ainda estabelecer-se. Assentar. Mas a verdade é que Queen já existia e é sempre ser difícil ser o último a chegar. Ser o new guy. Freddie era Freddie: extravagante, ambicioso e único. Brian e Roger, além da mestria nas suas funções, já traziam bagagem musical, juntos, de uns dois/três anos. E de repente, aparece Deacon… Tímido, reservado e quase um nerd da tecnologia, a rivalizar com May. No meio daquela loucura toda… No meio das plumas e eyeliner de Mercury e da sensibilidade puramente rock do baterista e do guitarrista. E na verdade, este novo baixista nem ficou muito impressionado com a nova banda… Freddie mudou-lhe até o nome no 1º disco, para o tornar mais interessante. Mas Deacon logo aí deu pistas da sua personalidade, ao 2º disco, voltou ao nome original. Creio que esta não submissão, apesar de ser o miúdo, mostra bem o que viria a seguir… E à medida que os 70’s iam avançando, ia-se começando a mostrar ao nível da escrita. E começou com estrondo, com uma das melhores e mais relevantes músicas da história da banda, You’re my best friend.

Na página A Kind of Queen li uma reflexão interessante sobre Deacon, onde se escreve que o baixista abandonou a banda porque a sua personalidade, de tão contrastante com o Freddie, só se sentia segura na sombra do vocalista e que ele apenas só queria tocar com aqueles três amigos, no background. Não discordando por completo, não acho que seja tão simples assim. Deacon sempre foi um auto-crítico das suas habilidades enquanto cantor, sim. Sempre se viu “perdido” sem os Queen (basta ver o seu desaparecimento em 85 e sua quase inexistente produção fora da banda). Mas não acho que seja tão simples… Para John Deacon, a banda desde cedo foi também um emprego. Diferente do resto, sim. Com vantagens únicas, mas um emprego. Mas um emprego familiar, que só existe naqueles moldes. Naquele formato. Em família. Começamos juntos, acabamos juntos. Os Queen fortaleceram-se no choque de personalidades e John rapidamente, apesar do seu feitio reservado, se apoderou do seu espaço no seio da banda. Tomou para si certas… “pastas”. E para perceber isso é ver o modo como assumiu a parte financeira, após a rejeição de um empréstimo para a casa (a mesma onde ainda mora). Ou de como foi irredutível com Another One Bites The Dust ou Back Chat. Deacon, segundo pessoas próximas da banda, era o mais calado, mas quando abria a boca conseguia calar a sala. Tal como nas famílias. Há sempre o mais tímido, o mais calado. Aquele que depois se revela nas “festas” e parte a loiça e depois, desaparece. Por isso, não acho que John tenha estado apenas na sombra, não era só uma espécie de calma na tempestade. Era uma peça que claramente faltava. Quer a nível musical, quer ao nível de personalidade. Sem Deacon, os demais três teriam de se construir de outra forma. E confesso que esses traços de personalidade fascinam-me. O modo como se impôs pela calma… Por ser firme, determinado e de convicções fortíssimas (com estas a levarem ao limite do atrito em Hot Space). Mas John não recuou no disco. Mas soube comprometer-se ao vivo, deixando fluir sonoridades mais rock nas músicas. Porque tal qual os demais, ele também sabia que mais importante que os respectivos e enormes egos eram os fãs.

Brian, Roger e outros próximos da banda e amigos de infância afirmam que Deacon afogou-se primeiro num estado de fragilidade mental, esgotado com a tour de 86, onde abusou do álcool, e depois numa depressão com a morte de Freddie Mercury, de quem se foi tornando cada vez mais próximo com o andar dos anos, relação essa que o iria moldar para sempre. E segundo May, Deacon sempre foi algo frágil e para Taylor aquele sempre foi um sociopata. Se a isto juntarmos os raríssimos avistamentos em 22 anos, pintamos um quadro daquele homem típico no início da 3ª idade, numa vulgar camisola azul, a fumar um cigarrito e metido na sua vidinha. Os menos atentos nunca iriam perceber, aquele homem escreveu I Want To Break Free… Deacon, nestas duas décadas que o separam da música, apenas foi igual a si próprio. Não está na sombra, não está simplesmente escondido… A sua retirada, se olharmos bem, é um statement. Vive do mesmo modo como viveu na banda. O seu silêncio fala, a meu ver, mais alto que muitas palavras. E não sei quantas coisas não terão sido já vetadas por ele nestes anos… Mais uma vez, o baixista percebe que mais importante que as suas convicções (tal como em 82) são os fãs… E perante a vontade de May e Taylor em continuar a carregar o nome Queen e sabendo a “fome” dos fãs, não seria autista o suficiente para vetar isso (e Deacon fá-lo-ia sem hesitar).


Para John, os Queen, actualmente, não fazem sentido algum, a meu ver. Para ele, tudo terminou com as sessões de Made In Heaven, em 95, e só porque havia a voz de Freddie, o seu amigo, para trabalhar. Mas não duvido que se fosse qualquer um dos demais a falecer que Deacon iria ter a mesma postura. E como tudo terminou, e tendo já uma fortuna apreciável, dedica-se a viver a outra vida que sonhou desde miúdo… Em casa, sossegado, longe do barulho. Das luzes. E o dinheiro ganho com os Queen permite-lhe isso, a retirada. A bem da sua sanidade mental. Da sua protecção! Estou certo, nunca mais “veremos” John Deacon. O melhor que podemos fazer por ele, é esquecê-lo desde 97 para cá… Passar por ele na rua e não o conhecer.


Por fim, um pequeno trivia. Reza a lenda que a passagem “Don't drink and drive my car, Don't get breathalised” da música Don’t Loose Your Head é uma inside joke dirigida ao baixista, que havia sido apanhado com o “grau” entretanto. E a terminar, como esquecer a famosa tirada “two tits John Deacon”…

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