“Nós vimos 20 minutos do filme acabado e pensámos que era muito bom. Nós queríamos algo que fosse uma verdadeira banda sonora. É pioneiro em muitas coisas, porque uma banda de rock não tinha feito isto antes...”
Brian May
O nono álbum de estúdio dos Queen foi a banda sonora do filme Flash Gordon, uma aventura extravagante baseada na personagem de uma banda desenhada surgida em 1934. Foi a primeira incursão do grupo no mundo do cinema e seria a sua única banda sonora completa. Mais tarde, em 1986, escreveriam algumas canções para o primeiro filme Highlander, temas que depois seriam reformulados e incluídos no álbum A Kind Of Magic (que não é uma banda sonora), desse mesmo ano.
A banda sonora de Flash Gordon foi gravada para uma nova versão do filme de ficção científica a preto e branco dos anos 1930, da autoria do realizador Mike Hodges e do produtor Dino De Laurentiis, com um orçamento de 22 milhões de dólares. Os Queen foram contractados pela primeira vez em 1979 e, como compor uma banda sonora era algo que todos os membros da banda queriam eventualmente fazer, o empresário Jim Beach marcou uma reunião com De Laurentiis e mencionou o interesse do grupo no projecto. Diz-se que a reacção inicial de Laurentiis terá sido «Quem são os Queen’s?». Ao que parece, os Queen foram a primeira banda de rock que o produtor ouviu na vida e o desfecho foi a contratação do grupo para compor a música para o filme, projecto que resultaria em alguns temas e diálogos inesquecível.
Roger Taylor: «Já nos tinham proposto uns quantos filmes, mas Flash Gordon cativou-me a mim e ao Brian por causa da conotação com a ficção científica dos anos 1930. Tivemos total controlo sobre o álbum e a ideia de incluir diálogos foi nossa. Não era essa a ideia original. Decidimos integrar pequenos trechos para se ter uma noção do que estava a acontecer no filme e também um pouco da atmosfera da história».
Tendo terminado há pouco tempo uma longa digressão europeia e um período de três semanas no Japão, de Janeiro a Maio, os Queen passaram o verão de 1979 a trabalhar no álbum The Game, sobretudo nos estúdios Musicland, em Munique. Foi durante estas sessões que começaram também a trabalhar na música de Flash Gordon. Produzir dois álbuns em simultâneo não foi fácil, mas ambos progrediram bem. Depois de umas férias e de outros projectos, a banda voltou à estrada para uma digressão pelo Reino Unido e Irlanda, no final de Novembro. O espectáculo final realizou-se a 26 de Dezembro (no Hammersmith Odeon, em Londres), numa iniciativa de angariação de fundos para a UNICEF, para ajudar a população de Kampuchea. O trabalho nos álbuns Flash Gordon e The Game foi retomado na primeira metade de 1986, novamente em Munique, seguindo-se uma digressão norte-americana, que começou em Julho e decorreu até Outubro. Após umas merecidas férias, os Queen regressaram à banda sonora de Flash Gordon, nos estúdios Anvil, em Londres, e terminaram o projecto em Novembro.
A composição, a interpretação, os arranjos e a produção executiva estiveram a cargo dos Queen, sendo os créditos de produção geral do álbum atribuídos a Brian May e Reinhold Mack. À semelhança de The Game, o primeiro álbum dos Queen a recorrer a sintetizadores, Flash Gordon continuou a tendência, mas de forma muito mais intensa. Howard Blake dirigiu a orquestra, que está muito presente ao longo do filme, realçando a música dos Queen, como se pode ouvir na banda sonora.
Brian May explicou mais tarde: «Vimos 20 minutos do filme acabado e achámo-lo muito bom e extravagante. Queríamos fazer algo que fosse uma verdadeira banda sonora. É pioneira em muitos aspectos, porque nenhum outro grupo de rock tinha feito nada do género antes, ou então era algo mais apagado e tinha-lhes sido pedido que escrevessem música de fundo sentimental. Mas nós tivemos total liberdade para fazer de que gostássemos, desde que a nossa música enaltecesse a história».
Flash Gordon foi lançado no Reino Unido a 8 de Dezembro de 1980 – uma data famosa por ter sido o dia em que John Lennon foi assassinado em Nova Iorque. Este acontecimento chocante inspiraria mais tarde Brian e Freddie a escreverem duas canções, Put Out The Fire e Life Is Real (Song For Lennon), para o álbum Hot Space, de 1982. A banda também interpretou a canção Imagine, de Lennon, num concerto realizado em Londres um dia após a notícia da sua morte – um tributo ao homem que (com os restantes Beatles) tinha sido uma influência enorme para os Queen.
Nos Estados Unidos, Flash Gordon foi editado no mês seguinte, a 27 de Janeiro de 1981. O álbum alcançou o 10.º lugar nas tabelas do Reino Unido e o 23.º nos Estados Unidos, conseguindo o estatuto de Disco de Ouro nos dois países. Chegou ao 2.º lugar na Alemanha e foi o n.º na Áustria.
O conceito da capa foi proposto por Freddie: o logótipo de Flash Gordon sobre o fundo amarelo vivo, com uma cena do filme na parte de trás. A capa interior, por sua vez, exibia quatro fotografias individuais da banda tiradas durante a digressão norte-americana do álbum The Game, em 1980.
Apesar de alguns fãs terem ficado hesitantes ao saberem que o grupo tinha gravado músicas para um filme de aventuras inspirado numa personagem de banda desenhada, o álbum seria uma agradável surpresa a vários níveis. A música funciona bem como acompanhamento para as imagens do filme, pontuada por efeitos sonoros e diálogos do elenco, incluindo Max Von Sydow, Timothy Dalton, Topol e o grande actor britânico Brian Blessed. Mas as reservas dos fãs rapidamente se desvaneceram quando Flash, o único single extraído do álbum, foi lançado em todo o mundo, antes da banda sonora completa, tendo conseguido uma boa prestação nas tabelas.
Os títulos de todas as faixas foram atribuídos de acordo com a parte do filme para que cada tema foi composto e, quando se ouve o álbum por si só, fica-se com uma ideia vivida do que está a acontecer na história. O drama da acção, os diálogos e os efeitos especiais grandiosos, sempre acompanhados do som inconfundível dos Queen, são uma combinação fascinante e extremamente invulgar.
O álbum abre com a versão da banda sonora de Flash’s Theme, a primeira das duas únicas músicas do álbum que apresentam linhas vocais propriamente ditas. A segunda é o tema The Hero, dominado pela guitarra, e que fecha o álbum de forma imponente. Ambas as canções foram escritas por Brian, e enquanto a primeira foi lançada em single (embora numa versão diferente), The Hero nunca chegou a ser editada neste formato. Possui uma magnífica interpretação vocal de Freddie, bem como percussão, baixo e guitarra poderosos. Ambas foram interpretadas nos concertos da época e recebidas com entusiasmo pelo público – especialmente The Hero, como se pode ver o ouvir no CD/DVD do álbum Queen On Fire – Live At The Bowl.
As restantes faixas são sobretudo instrumentais pontuadas por alguns diálogos, e apesar de várias músicas terem menos de um minuto, algumas contêm momentos verdadeiramente magníficos dos Queen no seu melhor, com sons emotivos que combinam na perfeição com as cenas do filme.
Brian contribuiu também com os temas Flash To The Rescue, que incorpora o conhecido ritmo de Flash e alguns elementos intrigantes do filme; e Battle Theme, que exibe o som característico do seu baixo antes de a música passar de forma explosiva a Crash Dive On Mingo City, também da sua autoria. A majestosa The Wedding March de Wagner recebe o tratamento especial de May/Red, na mesma linha de God Save The Queen cinco anos antes. Marriage Of Dale And Ming (and Flash approaching), que Brian escreveu juntamente com Roger, contém versos de Flash e ainda mais guitarra, enquanto Flash’s Theme Reprise (Victory celebrations) conclui a história num estilo verdadeiramente heróico.
As outras composições de Roger são In the Space Capsule (The Love Theme), com os sinistros sons de bateria e uma explosão sinfónica no final; a pesada e funesta In the Death Cell (Love Theme Reprise); e Escape From the Swamp, dominada pelo som tenso dos tímpanos.
Freddie escreveu o igualmente ameaçador Ming’s Theme (in the Court of Ming the Merciless); The Ring (hypnotic seduction of Dale), que inclui uma linha de sintetizadores verdadeiramente arrepiante; a frenética Football Fight, e a tipicamente romântica The Kiss (Aura resurrects Flash). O vocalista compôs ainda Vulcan’s Theme (Attack of the Hawk Men), em que a bateria e os sintetizadores aguerridos acompanham na perfeição uma batalha épica nos céus, que conta com o actor Brian Blessed (ele próprio um fã dos Queen) tempestuoso como sempre.
John compôs Execution Of Flash, que apresenta alguma vozes divinais de Freddie, e Arboria (Planet of the Tree Man), um interlúdio sinistro mas tranquilo, que reúne algumas das personagens principais do filme no momento em que se unem para enfrentar o poderoso e implacável governante Ming.
O filme estreou em Londres, em Dezembro de 1980, e foi bem-recebido por fãs e críticos, com a imprensa a dar um destaque especial à música dos Queen, mais tarde nomeada para um prémio Ivor Novello. Em Fevereiro de 1981, os Queen foram convidados de honra na estreia do filme Flash Gordon em Tóquio.
É fácil subestimar este álbum, com a estética ousada de Flash Gordon e os seus temas invulgares, não sendo claramente um álbum de estúdio tradicional dos Queen. Porém, podemos encontrar aqui alguns tesouros surpreendentes.
Disc 1
1 - Flash's Theme (Brian May)
2 - In The Space Capsule (The Love Theme) (Roger Taylor)
3 - Ming's Theme (In The Court Of Ming The Merciless) (Freddie Mercury)
4 - The Ring (Hypnotic Seduction Of Dale) (Freddie Mercury)
5 - Football Fight (Freddie Mercury)
6 - In The Death Cell (Love Theme Reprise) (Roger Taylor)
7 - Execution Of Flash (John Deacon) (Freddie Mercury)
8 - The Kiss (Aura Resurrects Flash) (Freddie Mercury)
9 - Arboria (Planet Of The Tree Men) (John Deacon)
10 - Escape From The Swamp (Roger Taylor)
11 - Flash To The Rescue (Brian May)
12 - Vultan's Theme (Attack Of The Hawk Men) (Freddie Mercury)
13 - Battle Theme (Brian May)
14 - The Wedding March (Brian May)
15 - Marriage Of Dale And Ming (And Flash Approaching) (Brian May)
16 - Crash Dive On Mingo City (Brian May)
17 - Flash's Theme Reprise (Victory Celebrations) (Brian May)
18 - The Hero (Brian May)
Disc 2
1 - Flash (Brian May)
2 - The Hero (October 1980... Revisited) (Brian May)
3 - The Kiss (Early Version, March 1980) (Freddie Mercury)
4 - Football Fight (Early Version, No Synths! - February 1980) (Freddie Mercury)
5 - Flash (Live in Montreal, November 1981) (Brian May)
6 - The Hero (Live in Montreal, November 1981) (Brian May)
(Flash Gordon (2011 Remaster) (Deluxe Edition))
SINGLES
Flash, acompanhado de Football Fight, foi lançado no Reino Unido no dia 24 de Novembro de 1980, e chegou ao 10.º lugar, tendo sido distinguido com um Disco de Prata. Também entrou para o top 10 na Irlanda, atingiu o 3.º lugar na Alemanha e foi n.º 1 na Áustria. Nos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Japão, onde foi lançado dois meses mais tarde, o single surgiu com o nome Flash’s Theme (A.K.A. Flash), daí a confusão que perdura até hoje cada vez que a faixa é referida. Umas vezes é Flash, outras Flash’s Theme. O autor da canção prefere o último.
A versão do single é bastante diferente da do álbum já que Brian lhe acrescentou alguns diálogos do filme, tornando-a uma música mais completa e com uma relação mais clara com a história. É especialmente apelativa para ser tocada na rádio.
O vídeo de Flash foi gravado nos estúdios Anvil, em Londres, e, tal como o filme, foi realizado por Mike Hodges. Os Queen obtiveram permissão para usar excertos do filme, intercalados com imagens da banda.
DIGRESSÃO
Depois do enorme sucesso da maior digressão dos Queen nos Estados Unidos, entre Junho e Outubro de 1980, que culminou com quatro noites esgotadas no Madison Square Garden de Nova Iorque, a banda iniciou uma tournée pela Europa. Começando na Suíça, em Novembro, e terminando na Alemanha, em Dezembro, os Queen regressaram ao Reino Unido para dois concertos em Birmingham e três em Londres. Os espectáculos incluíam Battle Theme, Flash e The Hero, todos do novo álbum. Vultan’s Theme seria acrescentada ao alinhamento dos concertos no Japão, no ano seguinte.